Formação das Almas: o imaginário da República no Brasil - José Murilo de Carvalho
Por Cintia Marques.
Um Herói para o Novo Regime
Ao refletir sobre a construção da República
brasileira vêm à tona as concepções de Roberto Matta e Honório Rodrigues. Ambos
se referem ao tema conciliação como marcante na cultura brasileira. Roberto trata
dessa questão afirmando que o brasileiro tem aversão a conflitos e definições
rígidas, optando pela integração e conciliação; já Honório afirma que a
conciliação é uma estratégia que a elite encontrou para manipular as massas
visando atender a seus anseios políticos, convencendo o povo de que ele é
pacífico e ordeiro e gerando certo conformismo.
Essa discussão se enquadra perfeitamente
na maneira em que foi implantada a república no Brasil, a liderança política do
velho e novo sistema se uniu de forma conciliatória, sem choques ou rupturas
bruscas. O exército foi quem garantiu a implantação do governo republicano nessas
linhas, trazendo certa estabilidade. O povo, que deveria ser protagonista desse
processo, foi espectador, para que fosse garantido o projeto de implantação de
um novo regime como continuidade de práticas antigas, uma conciliação, sem
recorrer a rupturas.
Em sua obra Formação das Almas, José
Murilo de Carvalho tece todo o imaginário da República, nela podemos ver que a
participação do povo na implantação da republica foi ínfima, principalmente se
comparada com os Estados Unidos, país no qual a atuação do povo foi demasiado
importante.
O que me chamou mais atenção nesta
marcante obra é a forma mítica da origem da República e a dificuldade de se
construir um herói para esse novo regime que acabara de ser implantado. A
procura fora intensa, passando por grandes nomes tais como: o Marechal Deodoro
da Fonseca, Benjamin Constant e Floriano Peixoto. Porém a nação encontrou esse
herói na figura humanizada e cristã de Tiradentes.
Este herói surge de modo forçado,
forjado com o âmago de causar a
admiração de um povo que assistiu ao surgimento da república, foram dormir com
a monarquia e acordaram diante de um novo regime. A busca de um herói para a
República acabou tendo êxito onde não imaginava muitos dos participantes da
proclamação. Diante das dificuldades em promover um protagonista do dia 15,
quem aos poucos foi capaz de atender as exigências da mitificação fora
justamente Tiradentes, pois o mesmo se enquadrava perfeitamente nessa tentativa
de convencer o povo da conciliação. Para
Carvalho, o êxito de Tiradentes estava na sua identificação com Cristo,
passando pelos mesmos sacrifícios, tocando o sentimento popular. Portanto, os
republicanos tomam a dianteira da apropriação de sua memória, uma vez que,
segundo Carvalho: “a elaboração de um imaginário é parte da legitimação de
qualquer regime político”.
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