segunda-feira, 14 de maio de 2012

A ‘Primeira República’ nos livros didáticos de História: uma reflexão quanto ao conteúdo, o método e à idéia de República transmitida

Livro analisado: COTRIM, Gilberto. História & consciência do Brasil, 2: da independência aos dias atuais: 1º grau / Gilberto Cotrim. – 9. ed. – São Paulo: Saraiva, 1996.
Equipe: Anderson Holanda; Isabela Dias; Monike Moura; Jéssika Adrielly; Suzane Araújo.
Conteúdo abordado
O autor dedica três capítulos do seu livro ao período da Primeira República. No capítulo 9 – intitulado Instalação e Consolidação da República – o primeiro assunto destacado foi o governo provisório da República, suas ‘intenções’ e ‘primeiras medidas’, assim como a forte influência do positivismo de Comte. Ainda neste tópico foi lembrado o problema da crise financeira, desencadeada pela reforma – conhecida como ‘encilhamento’ – executada por Rui Barbosa (então ministro da Fazenda) que visava o desenvolvimento industrial do país (grande emissão de dinheiro: inflação, empresas fantasmas, alta especulação, desorganização financeira e insatisfação dos cafeicultores). Também ‘a primeira Constituição da República’ (que teria sido bastante influenciada pela dos EUA) mereceu destaque do autor para os pontos considerados fundamentais: a ‘forma de governo’ (republicana); a ‘forma de Estado’ (federalista); o ‘sistema de governo’ (presidencialista); os ‘poderes do Estado’ (executivo, legislativo, judiciário); a questão do ‘voto’ (e suas limitações). O capítulo se encerrará tratando precisamente do governo de Deodoro da Fonseca (1891) – destacando aspectos como o encaminhamento das eleições, o fechamento do congresso, a organização da oposição, a primeira revolta da Armada e, por fim, a renúncia – e do governo de Floriano Peixoto (1891-1894) – destacando suas primeiras medidas, o firme combate à oposição que lhe renderia a alcunha de “Marechal de Ferro”, a segunda revolta da Armada e, finalizando, a ‘Revolução Federalista’ iniciada em 1893.
No capítulo 10 – intitulado A República dos Fazendeiros – o autor inicia dividindo a chamada ‘República Velha’ em duas fases: A ‘República da Espada’ (1889-1894) – como o período dos governos militares de Deodoro e Floriano – e a ‘República dos Fazendeiros’ (1894-1930) – como período do governo civil. Destacando ‘a força do coronelismo’, são mencionadas questões como a política de favores, o voto de cabresto, as fraudes e disputas eleitorais, e ainda uma relação do coronelismo com a atualidade. Outro aspecto mencionado é ‘A política dos governadores’, que o autor destaca como sendo a reprodução, no plano federal, da rede de compromissos que ligava os coronéis e os governadores dentro dos estados. Aqui, como não poderia faltar, será destacada a conhecida ‘política do café com leite’.  A crise enfrentada pela economia cafeeira em razão da superprodução (oferta maior que procura: queda brusca dos preços e acúmulo de estoques) é lembrada no tópico ‘o café e a liderança das exportações’, assim como a reunião dos cafeicultores visando solucioná-la (‘Convênio de Taubaté’). O capítulo finaliza-se com o tópico ‘A indústria e o movimento operário’, no qual são destacadas questões como a industrialização de São Paulo, o crescimento industrial do país, a importância que vai ganhando o setor urbano. Esses seriam os principais fatores que dariam maior relevo às ‘lutas operárias’, questão para qual o autor dedica boa parte do capítulo, finalizando com a greve de 1917.
O capítulo 11 irá tratar das Revoltas na República Velha. Destacando inicialmente a questão do messianismo, o autor aponta duas revoltas que teriam sido por ele influenciados: a revolta de Canudos e a guerra do Contestado. Após discorrer sobre elas, o autor traz ainda a Revolta da Vacina e a Revolta da Chibata. Por fim, ao tratar da temática do ‘Tenentismo’, o autor destaca aspectos como: as principais propostas do movimento tenentista; as revoltas do Forte de Copacabana, assim como a de 1924; e por último a Coluna Prestes.
Como o autor aborda
O primeiro aspecto a chamar atenção são as citações na abertura de cada capítulo: a partir delas o autor instiga o aluno, além de dá indicativos dos seus referenciais e da sua concepção sobre o período. Na abertura de cada capítulo, Cotrim escreve, como uma pequena introdução, uma visão daquilo que irá discorrer no capítulo, deixando explícita nessas passagens a idéia que tem daquele momento histórico. Dividindo em tópicos e subtópicos, de maneira a facilitar o entendimento e até mesmo a memorização, o autor seleciona os aspectos que considera relevantes em um determinado recorte temporal. Outro recurso didático é o uso de palavras-chave, que são destacadas em negrito e colocadas na forma de tópicos (ex.: principais medidas do governo provisório, pontos fundamentais da primeira Constituição republicana, etc.).
São distribuídos pelos capítulos alguns quadros informativos, alguns explicativos de determinados termos, outros como recurso para chamar a atenção do aluno para algum aspecto importante. As imagens usadas são bastante antiquadas, a citar a de Deodoro da Fonseca proclamando a República, da bandeira do Brasil, de uma plantação de café, etc. Um aspecto interessante é o quadro que é colocado em cada capítulo intitulado “leitura e reflexão”, onde o autor estimula o aluno a pensar sobre este ou aquele aspecto. Por um lado estimula a reflexão, mas por outro a delimita, além de se mostrar bastante tendencioso a um conservadorismo monarquista. Mas o que mais chamou atenção do grupo foi o poder de síntese e o estruturalismo do autor. Se seus capítulos já são bastante sintéticos, ainda não satisfeito, ao final de cada um o autor resume-os a um quadro intitulado “sinopse histórica”, com os principais temas abordados e algumas frases sobre cada um. Para finalizar a estrutura do capítulo o autor levanta algumas questões no quadro intitulado “revisão pontos-chaves”. Um aluno “esperto” (no sentido da malícia) faria uma boa prova estudando apenas por esse “esquema”, já que essa estrutura aponta para uma história decoreba, ao modo antigo.
Percebe-se que o livro tem uma abordagem bastante tradicionalista, chegando ao cúmulo de apresentar uma lista com o nome de todos os presidentes da chamada República Velha, seu “período de governo” e “procedência política”. Seguindo um raciocínio cronológico e informativo dos acontecimentos, são apontados fatos e características dos períodos, contribuindo para o congelamento das idéias. Mesmo focando na questão social (sobretudo nos capítulos 10 e 11), sua abordagem não problematiza a questão da cidadania, não suscita uma reflexão mais profunda, se contenta com a superfície dos fatos e apresentação de personagens e pontos-chaves, não traz referências bibliográficas, nem filmografia, nem diálogo com outros historiadores (apesar de ficarem explícitas a quem analisa seu livro algumas de suas influências).   
A Compreensão do autor acerca da Primeira República
O autor tentar quebrar com algumas idéias, como a da apatia popular (sobretudo no capítulo 11) – o povo brasileiro não seria tão pacífico, cordial, tese que busca confirmar apresentando os desdobramentos de algumas revoltas. Mas ainda apresenta uma visão completamente maniqueísta da História, sempre vitimando o povo e culpando as classes dominantes pelo atraso, corrupção, e bagunça política do período. Percebe-se como o autor corrobora com a idéia da República Velha como um período de bagunça política e econômica, uma escrita ainda muito influenciada pela idéia lançada pelo Estado Novo. Mesmo o povo esbanjando algumas revoltas, essas eram soltas e desarticuladas. Apresenta a instalação da república como “golpe republicano” e ao final do primeiro capítulo lança um debate no mínimo tendencioso, contrapondo República à Monarquia, e apresentando as vantagens da última. Uma das críticas que fundamentam a sua concepção sobre a República é que a queda da monarquia não contara com a participação popular. Além disso, o Brasil mudava a forma de governo sem revolucionar a sociedade. A República oligárquica é estigmatizada como um período de completa corrupção, mas no meio do qual surgem as primeiras fábricas, quando o país inicia a industrialização após a crise cafeeira, e quando surge o movimento operário, a luta pelos direitos frente a exploração das classes dominantes. 

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