domingo, 18 de março de 2012

1889

Por Raphael França

Nos fins do século XIX, quando se deu a proclamação da república brasileira, existia no contexto do mundo ocidental uma batalha ideológica acerca das utopias republicanas. Estas ideologias baseavam-se em duas formas de liberdade: a antiga e a moderna. Por antiga entendemos uma participação direta do povo no governo do Estado, a decisão em praça pública dos rumos da nação. Em oposição, a liberdade moderna seria caracterizada pela representação, tendo em vista que o homem econômico moderno não dispor de tempo a perder referendando coisas de governo. Fundadas em um destes dois alicerces teríamos três versões de república nas mentes dos atores de 1889: Jacobina, Liberal e Positivista.

O modelo liberal, advindo na Revolução Americana de 1776 é baseado na liberdade moderna, ou seja, a representatividade inibindo a participação popular. Os senhores do café paulista eram partidários desta alternativa, pertenciam ao partido republicano mais organizado do país[1], eram acompanhados pelas elites das províncias mais ricas como Minas Gerais e o Rio Grande do Sul. Visavam o federalismo, que os deixaria com uma maior liberdade em relação ao governo do Rio de Janeiro. O problema deste plágio seria a falta de uma revolução anterior que diminuísse drasticamente a desigualdade como acontecera nos EUA.

A jacobina refere-se aos primórdios da Revolução Francesa de 1789, na qual o povo participou diretamente da derrubada do antigo regime, agindo posteriormente no governo do Estado. Este modelo chega a ser adotado parcialmente por Floriano Peixoto. Porém, de acordo com José Murilo de Carvalho, “caso tivesse sido tentada qualquer revolta do tipo pretendido, o povo que em Paris saiu às ruas para tomar a Bastilha e guilhotinar os reis não teria aparecido” [2]. Os simpatizantes do jacobinismo à brasileira ainda acreditavam no estado.

A outra opção que aparece no cenário seria o Positivismo influenciado por Comte. Esta forma de governo encontrou seu maior defensor em Benjamin Constant. Também conseguiu absorver a parcela da classe média e operária desiludida com a impossibilidade de um jacobinismo. Prometia a incorporação do proletário e o fim das desigualdades. Sua receita para conseguir esta façanha era a implantação de uma ditadura republicana, na qual o executivo suplantaria o legislativo e o judiciário, os quais seriam seus instrumentos no caminho da sociedade metafísica representada pela monarquia para a positiva. Uma parcela significativa dos militares era adepta desta vertente.

A origem da república, assim como sua consolidação será disputada por vários grupos após 15 de novembro. Os militares com Deodoro da Fonseca, os positivistas com Benjamin Constant e os Liberais com Quitino Bocaiúva. Um fato preponderante é que a república brasileira irá herdar um grave problema do império: A formação de uma identidade nacional que funcionasse como uma liga para a república. As conseqüências desta falta de identidade eram notórias, decorrentes da abolição da escravidão e a posterior incapacidade do estado em incorporar o negro à sociedade. Como se formar uma identidade nacional se a maior parcela da sociedade sofria de exclusão? O Brasil, o segundo maior país negro do mundo, mais de um século depois da abolição ainda não consegue findar com a exclusão social da maior parcela da sociedade, assim como não o fez a monarquia e muito menos o governo que se instaurou em 1889.



[1] CARVALHO, José Murilo. A Formação das Almas: o imaginário da república do Brasil, São Paulo, Companhia das Letras, 1990. p 24.

[2] Idem, p 26.

Um comentário:

  1. Raphael. E vc não teria nenhum questionamento a fazer a respeito dessas repúblicas no contexto brasileiro?

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