domingo, 18 de março de 2012

A representatividade política no Brasil


                                                                                        Bruno Vitor

- E então, já sabe em quem vai votar?
- Tô decidindo ainda. Um candidato lá do bairro até já falou comigo, mas ainda não sei.
- Eu vou votar em Fulano. Uma vez a gente passou um aperto lá em casa e ele arrumou uma cesta básica...

       Em boa parte dos casos, esse diálogo ilustra o processo de decisão política do brasileiro. Isso nos remete a questões bem pertinentes sobre a nossa cultura política. Primeiro, a questão da própria representatividade política em nosso sistema eleitoral e segundo, a personificação de ideias e valores em determinadas figuras desse meio.
       Quando José Murilo de Carvalho cita Benjamin Constant na obra A formação das Almas, fala da forma moderna de fazer política, ou seja, a representação direta não tem mais espaço, uma vez que o cidadão não tem mais tempo e/ou interesse em se dedicar a tais assuntos, tal qual os gregos faziam em praça pública. Diante disso, se conclui que o cidadão está mais interessado em buscar sua satisfação pessoal que em envolver-se com as decisões políticas diretamente. Há uma espécie de terceirização: é eleito um representante que será pago para tomar decisões e cuidar “desses assuntos”. Vem à tona a crítica feita por J. J. Rousseau, que diz em O contrato Social que os ingleses se iludem ao pensar que participam das decisões políticas de seu país, pois apenas decidem durante as eleições, tendo depois que se sujeitar ao que decidirem os eleitos.   
        Ora, escolher os representantes faz parte do processo político. Pode parecer ingênuo pensar que outrem representará plenamente nossas vontades e atenderá a todas as nossas necessidades, mas a lógica do processo é bem essa mesmo. Aquele representante que mais se aproximar das qualificações exigidas pelo cidadão que o elege será a sua escolha. Isso nos remete ao segundo ponto: como se escolher um representante?
        Como sugerido no pequeno diálogo no começo do texto, e corroborado por Constant, essa escolha acaba sendo muito pessoal. No processo decisório levam-se em consideração tanto as ações de um determinado candidato a representante quanto a imagem que se tem deste.
       O voto acaba se tornando uma moeda de troca: aquele a quem se deve mais é o que recebe. Esse ponto de vista acaba dando margem a uma série de arbitrariedades, não só porque nem sempre um determinado interesse é o de todos, mas também pela possibilidade de compra de votos e outras formas de chantagens.
       Outro fator que influencia na escolha de um representante é a imagem que se tem dele. Rodrigo Patto toca no tema ao falar do papel das representações na cultura política: a idéia que se tem de um representante, quais interesses ele representa e até mesmo quais os sentimentos que se tem com relação aquela pessoa.  
     Chegamos então a um ponto chave dessa discussão: como associar o modelo de representação indireta com a falta de interesse (ou interesses deturpados) do cidadão eleitor? Sim, porque se os representantes são eleitos por pessoas desinteressadas pela dinâmica desse processo, temos um grave problema, talvez o grande problema da política brasileira.
       Despertar o interesse pela política é crucial, afinal, é assim que se definem os rumos do país e consequentemente das nossas vidas. Criar uma consciência política é a estratégia mais eficaz contra qualquer tipo de fraude ou desmando dos nossos representantes. A partir do momento que passarmos a vê-los como nossos funcionários, o que de fato são, pensaremos duas vezes antes de empregar qualquer um. Não se trata de eleger ex-palhaços ou torneiros mecânicos, a discussão vai muito além. Tratas-se de utilizar critérios mais objetivos nas decisões e pensar com mais cuidado no bem da coletividade. E, uma vez eleito o representante, acompanhar com cuidado se está fazendo bem o trabalho que lhe foi delegado, e, caso contrário, mandá-lo para o olho da rua.        


CARVALHO, José Murilo de. A Formação das Almas: o imaginário da república do Brasil. São Paulo, Companhia das Letras, 1990.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. O Contrato Social. Porto Alegre, L&PM. 2009.

SÁ MOTTA, Rodrigo Patto. Culturas Políticas na História: Novos Estudos. Belo Horizonte, 2009.

3 comentários:

  1. A Proclamação ou as Proclamações?

    Suzane Araújo.

    “ Os militares fizeram a Republica!” Martinho Prado Júniro, in A Formação das Almas. Carvalho,José Murilo de.1990.p.52.

    Comecei a discussão por esse trecho retirado da obra de José Murilo de Carvalho, pois achei curioso o fato de que, esta frase ainda continua de maneira tão forte e presente nos tempos atuais.
    A República brasileira, ou melhor, "As Repúblicas" , para José Murilo, tiveram as suas origens ideológicas importadas de regiões como a França e América do Norte. À saber: o modelo de República Americana, Positivista e Jacobina, cada qual com as suas especificidades históricas e teóricas.

    O Brasil, em meio aos problemas políticos, econômicos e sociais vividos no Império, “precisou” importar algum desses modelos na tentativa de resolver esses impasses. Mas, os diversos grupos sociais formados, sobretudo por: pequenos e grandes proprietários, profissionais liberais, militares, professores, estudantes e jornalistas, se identificaram com alguma dessas correntes republicanas.
    Estas correntes deveriam abarcar em seu conteúdo ideológico, questões sobre a Liberdade do indivíduo, a participação ou não de civis na vida política, o desenvolvimento de políticas de inclusão, a promoção do progresso, a tentativa de formar um governo que representativo ou não e possuir um governante que agisse em prol dos interesses políticos econômicos de um determinado grupo. Só para citar alguns pontos relevantes.

    Uma vez que no Brasil se tinha uma gama de grupos sociais, e que, uma parte desses estavam ligados a alguma ideologia republicana, na medida em ocorre articulação política que desemboca na Proclamação da República em novembro de 1899, estas correntes digladiam entre si para determinar qual seria o papel que cada um dos participantes teria nessa Nova Ordem.

    Além disso, começa-se aí a busca para saber qual dos grupos entraria na “história oficial.”

    Sabe-se, que a presença militar na instalação da República foi notável, porém, não se pode atribuir somente a este grupo a participação nesse feito. Por trás, existia outras correntes republicanas nas quais, cada um dos seus líderes desejavam implementar um tipo de República na qual acreditavam ser o ideal para a concretização dos seus interesses, e por vezes, a do coletivo.
    A História tradicional tende a favorecer uma só visão dos fatos, além de valorizar os grandes feitos realizados por homens/grupos importantes. Talvez, seja por isso que nos livros didáticos e no pensamento do censo comum, ainda se tenha em mente que a República foi proclamada e idealizada exclusivamente por Deodoro, um oficial membro do Exército.

    É ai que retornamos para a afirmação feita no início da discussão, na qual mostra uma visão tendenciosa e unívoca, pois revela apenas o caráter de um só grupo, e não contempla as demais vertentes republicanas. Grupos esses que também estavam engajados na instalação de um Novo Regime, cada qual com as suas ideologias e aspirações específicas.

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  2. Boa reflexão política Bruno! Acho que demostra que enquanto cidadãos nós nos preocupamos. Mas como historicamente se formou esse cidadão desinteressado? Essa é a questão que estamos tentando entender.

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  3. Suzane, poste como autora!
    A gente bem que discutiu na sala de aula sobre o esforço dos militares durante a ditadura militar em reforçar esse papel dos militares... E é certo: é necessário quebrar essa homogeneidade, essa visão unívoca e mostra que o processo histórico é mais complexo!

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