Bruno Vitor
- E então, já
sabe em quem vai votar?
- Tô decidindo
ainda. Um candidato lá do bairro até já falou comigo, mas ainda não sei.
- Eu vou votar
em Fulano. Uma vez a gente passou um aperto lá em casa e ele arrumou uma cesta
básica...
Em boa parte dos casos, esse diálogo
ilustra o processo de decisão política do brasileiro. Isso nos remete a
questões bem pertinentes sobre a nossa cultura política. Primeiro, a questão da
própria representatividade política em nosso sistema eleitoral e segundo, a
personificação de ideias e valores em determinadas figuras desse meio.
Quando José Murilo de Carvalho cita
Benjamin Constant na obra A formação das
Almas, fala da forma moderna de fazer política, ou seja, a representação
direta não tem mais espaço, uma vez que o cidadão não tem mais tempo e/ou
interesse em se dedicar a tais assuntos, tal qual os gregos faziam em praça pública.
Diante disso, se conclui que o cidadão está mais interessado em buscar sua
satisfação pessoal que em envolver-se com as decisões políticas diretamente. Há
uma espécie de terceirização: é eleito um representante que será pago para
tomar decisões e cuidar “desses assuntos”. Vem à tona a crítica feita por J. J.
Rousseau, que diz em O contrato Social
que os ingleses se iludem ao pensar que participam das decisões políticas de
seu país, pois apenas decidem durante as eleições, tendo depois que se sujeitar
ao que decidirem os eleitos.
Ora, escolher os representantes faz
parte do processo político. Pode parecer ingênuo pensar que outrem representará
plenamente nossas vontades e atenderá a todas as nossas necessidades, mas a
lógica do processo é bem essa mesmo. Aquele representante que mais se aproximar
das qualificações exigidas pelo cidadão que o elege será a sua escolha. Isso
nos remete ao segundo ponto: como se escolher um representante?
Como sugerido no pequeno diálogo no
começo do texto, e corroborado por Constant, essa escolha acaba sendo muito
pessoal. No processo decisório levam-se em consideração tanto as ações de um
determinado candidato a representante quanto a imagem que se tem deste.
O voto acaba se tornando uma moeda de
troca: aquele a quem se deve mais é o que recebe. Esse ponto de vista acaba
dando margem a uma série de arbitrariedades, não só porque nem sempre um
determinado interesse é o de todos, mas também pela possibilidade de compra de
votos e outras formas de chantagens.
Outro fator que influencia na escolha de
um representante é a imagem que se tem dele. Rodrigo Patto toca no tema ao
falar do papel das representações na cultura política: a idéia que se tem de um
representante, quais interesses ele representa e até mesmo quais os sentimentos
que se tem com relação aquela pessoa.
Chegamos então a um ponto chave dessa
discussão: como associar o modelo de representação indireta com a falta de
interesse (ou interesses deturpados) do cidadão eleitor? Sim, porque se os
representantes são eleitos por pessoas desinteressadas pela dinâmica desse
processo, temos um grave problema, talvez o grande problema da política
brasileira.
Despertar o interesse pela política é
crucial, afinal, é assim que se definem os rumos do país e consequentemente das
nossas vidas. Criar uma consciência política é a estratégia mais eficaz contra
qualquer tipo de fraude ou desmando dos nossos representantes. A partir do
momento que passarmos a vê-los como nossos funcionários, o que de fato são,
pensaremos duas vezes antes de empregar qualquer um. Não se trata de eleger
ex-palhaços ou torneiros mecânicos, a discussão vai muito além. Tratas-se de
utilizar critérios mais objetivos nas decisões e pensar com mais cuidado no bem
da coletividade. E, uma vez eleito o representante, acompanhar com cuidado se
está fazendo bem o trabalho que lhe foi delegado, e, caso contrário, mandá-lo
para o olho da rua.
CARVALHO, José Murilo de. A Formação
das Almas: o
imaginário da república do Brasil. São
Paulo, Companhia das Letras, 1990.
ROUSSEAU, Jean-Jacques. O Contrato Social. Porto Alegre, L&PM. 2009.
SÁ MOTTA, Rodrigo Patto. Culturas Políticas na História: Novos Estudos.
Belo Horizonte, 2009.
A Proclamação ou as Proclamações?
ResponderExcluirSuzane Araújo.
“ Os militares fizeram a Republica!” Martinho Prado Júniro, in A Formação das Almas. Carvalho,José Murilo de.1990.p.52.
Comecei a discussão por esse trecho retirado da obra de José Murilo de Carvalho, pois achei curioso o fato de que, esta frase ainda continua de maneira tão forte e presente nos tempos atuais.
A República brasileira, ou melhor, "As Repúblicas" , para José Murilo, tiveram as suas origens ideológicas importadas de regiões como a França e América do Norte. À saber: o modelo de República Americana, Positivista e Jacobina, cada qual com as suas especificidades históricas e teóricas.
O Brasil, em meio aos problemas políticos, econômicos e sociais vividos no Império, “precisou” importar algum desses modelos na tentativa de resolver esses impasses. Mas, os diversos grupos sociais formados, sobretudo por: pequenos e grandes proprietários, profissionais liberais, militares, professores, estudantes e jornalistas, se identificaram com alguma dessas correntes republicanas.
Estas correntes deveriam abarcar em seu conteúdo ideológico, questões sobre a Liberdade do indivíduo, a participação ou não de civis na vida política, o desenvolvimento de políticas de inclusão, a promoção do progresso, a tentativa de formar um governo que representativo ou não e possuir um governante que agisse em prol dos interesses políticos econômicos de um determinado grupo. Só para citar alguns pontos relevantes.
Uma vez que no Brasil se tinha uma gama de grupos sociais, e que, uma parte desses estavam ligados a alguma ideologia republicana, na medida em ocorre articulação política que desemboca na Proclamação da República em novembro de 1899, estas correntes digladiam entre si para determinar qual seria o papel que cada um dos participantes teria nessa Nova Ordem.
Além disso, começa-se aí a busca para saber qual dos grupos entraria na “história oficial.”
Sabe-se, que a presença militar na instalação da República foi notável, porém, não se pode atribuir somente a este grupo a participação nesse feito. Por trás, existia outras correntes republicanas nas quais, cada um dos seus líderes desejavam implementar um tipo de República na qual acreditavam ser o ideal para a concretização dos seus interesses, e por vezes, a do coletivo.
A História tradicional tende a favorecer uma só visão dos fatos, além de valorizar os grandes feitos realizados por homens/grupos importantes. Talvez, seja por isso que nos livros didáticos e no pensamento do censo comum, ainda se tenha em mente que a República foi proclamada e idealizada exclusivamente por Deodoro, um oficial membro do Exército.
É ai que retornamos para a afirmação feita no início da discussão, na qual mostra uma visão tendenciosa e unívoca, pois revela apenas o caráter de um só grupo, e não contempla as demais vertentes republicanas. Grupos esses que também estavam engajados na instalação de um Novo Regime, cada qual com as suas ideologias e aspirações específicas.
Boa reflexão política Bruno! Acho que demostra que enquanto cidadãos nós nos preocupamos. Mas como historicamente se formou esse cidadão desinteressado? Essa é a questão que estamos tentando entender.
ResponderExcluirSuzane, poste como autora!
ResponderExcluirA gente bem que discutiu na sala de aula sobre o esforço dos militares durante a ditadura militar em reforçar esse papel dos militares... E é certo: é necessário quebrar essa homogeneidade, essa visão unívoca e mostra que o processo histórico é mais complexo!