domingo, 18 de março de 2012

“A Liberdade Guiando o Povo”? Primeira Republica & participação popular


“A Liberdade Guiando o Povo”?
Primeira Republica & participação popular
Jessika Adrielly

Ao nos debruçar sobre os albores da República Brasileira sobrevêm determinadas características que concorrem para particularizar essa experiência histórica. A política não se restringe a ideias, planos, partidos, manifestos, projetos, propagandas. Dela também faz parte às aspirações, as batalhas para ultrapassar os limites infligidos pela realidade. Todavia, com a proclamação da República em 1889, o Brasil parecia adentrar em outra conjuntura, achava-se longe das idealizações democráticas.
No fim do século XIX, Europa e os estados Unidos fervilhavam de novidades em todos os campos. O desenvolvimento das cidades e o surto industrial estimularam o surgimento de uma classe média constituída de trabalhadores da indústria e do comércio, além de funcionários públicos. A influência dos militares havia crescido após a campanha do Paraguai. Os novos grupos sociais influíram no movimento pela mudança do regime politico.
A República foi proclamada devido ao desgaste sofrido pela monarquia, à ineficácia perante mudanças necessárias ao lado da industrialização, a expansão do café, a monarquia tardava a modernização exigida pelos barões e empresários urbanos. Essa dificuldade gestou-se especialmente por estar estreitamente atrelada aos domínios mais conservadores da sociedade brasileira, uma vez que ela, a monarquia, formou-se sob os auspícios dos latifundiários e deles dependia.
Quando esses interesses foram alcançados pelas mudanças que estavam ocorrendo no mundo, o monarca parecia enfadado e pouco competente para nortear a nação em novas direções. O pausado processo de apropriação das transformações beneficiou as tradicionais elites que puderam, paulatinamente, assenhorar-se de fatias do descontentamento social.
Segundo Aristides Lobo, o propagandista da república, afirma com tristeza os eu desapontamento diante a proclamação do novo regime. Segundo ele, o povo, que pelo ideário republicano deveria ter sido protagonista dos acontecimentos, assistira a tudo bestializado, sem compreender o que se passava, julgando ver talvez uma parada militar[1].
Ao ser difundido o rumor da prisão de Deodoro da Fonseca, que se achava enfermo, a tropa movimentou-se contra o Gabinete do Barão de Ouro Preto. Nenhum tiro foi disparado e o governo tombou no amanhecer do dia 15 de novembro de 1889. Dom Pedro II só tomou conhecimento das ocorrências
perto da noite. O mesmo ambicionava desenvolver um novo gabinete sob comando de José Antônio Saraiva. Porém na tarde subsequente, 16 de novembro, foi avisado da determinação do Governo provisório de expulsa-lo do país.
Todavia, é um tanto intrigante quando passamos a nos questionar sobre a não participação do povo no episodio do dia 15 de novembro, visto que de acordo com experiência histórica de outros povos haveria uma relação de reforço recíproco entre a República e a cidadania.  Teoricamente, o novo regime trazia consigo a implantação de um sistema de governo que se propunha a trazer o povo para o proscénio da vida pública, acenando no sentido da ampliação dos direitos e da participação política.
Diante disso, não podemos negar que havia algo mais na política do que simplesmente um povo “bestializado”, ao modo de Aristides Lobo. Para José Murilo de carvalho, tal visão é insuficiente, afinal, trata-se do problema do relacionamento entre o cidadão e o Estado. 
Em Os Bestializados José de Murilo carvalho tenta entender que povo era este, qual o seu imaginário político e qual a sua prática política. Ele considera a cidade como lugar de maior representação da cidadania, ele enfatiza o Rio de Janeiro por ser a capital política e administrativa do Brasil República.
O autor trabalha de forma eloquente as transformações sociais, politicas e culturais do Rio de Janeiro, as várias concepções de cidadania vigentes na época, fala da participação eleitoral, relatando as instabilidades sociais. Em suma, Carvalho traz em seu livro a ideia de que a cidade não possuía cidadãos porque o poder permanecer fora do alcance das massas. O povo não era bestializado, apenas percebeu que o movimento republicano se tratava de “gente grande”, deste modo, propõe Carvalho (1998):

O povo sabia que o formal não era sério. Não havia caminhos de participação, a República não era para va­ler. Nessa perspectiva, o bestializado era quem levasse a política a sério, era o que se prestasse à manipulação. Num sentido talvez ainda mais profundo que o dos anar­quistas, a política era tribofe. Quem apenas assistia, como fazia o povo do Rio por ocasião das grandes trans­formações realizadas a sua revelia, estava longe de ser bestializado. Era bilontra.[2]

Embora se trate de uma investigação de natureza histórica, não restam ambiguidades de que o enigma da cidadania permanece no cerne da inquietação de todos os dias atuais, quando mais uma modificação de regime se executa e mais uma experiência é feita no sentido de edificar a comunidade política brasileira.




















REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BASBAUM, Leôncio.  História Sincera da República, de 1889 a 1930. São Paulo: Fulgor, 1968.
BELLO, José Maria.  História da República. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1976.
CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a Republica que não foi . 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

http://www.biblioteca.ufpe.br/pergamum/img/transp.gif
CARONE, Edgard. A Republica Velha. São Paulo: DIFEL, 1975.









[1] LOBO, Aristides apud BASBAUM, Leôncio.  História Sincera da República, de 1889 a 1930. São Paulo: Fulgor, 1968, p.18.
[2]
CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a Republica que não foi . 2. ed. -. Sao Paulo: Companhia das Letras, 1998, p.160.

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