segunda-feira, 16 de abril de 2012

"Os Bestializados - O Rio de Janeiro e a República que não foi"

Wellington Soares

José Murilo de Carvalho inicia a obra com a análise no primeiro capítulo sobre as condições da cidade do Rio de Janeiro, descrevendo em qual estrutura econômica, política e social estavam inseridos os fluminenses. Em seguida o autor traça o impacto causado pela mudança de Império, para República, afirmando que a primeira década republicana indubitavelmente foi o período mais turbulento da cidade. Para o autor a realidade da maior cidade do país em todos os âmbitos, a capital do Império e neste momento da República, o Rio de Janeiro engloba as necessidades e as dificuldades por quais passam as demais províncias do Brasil, visto que na época ela representava centro de influência política, econômica e cultural.
A instalação da República, considerado ato sequencial a abolição da escravidão, se encontra com as questões anunciadas com antecedência, a libertação da massa escrava traria como mais relevante o aumento do contingente de desocupados na cidade, associado ao número de imigrantes e oriundos de outras regiões da nação, inflacionando a quantidade de mão-de-obra livre em detrimento de trabalhos formais. É explícito no texto que durante este período grande parte da população era envolvida com meios ilegais de sobrevivência. O auto número de desempregados tornou comum a prisão de indivíduos sob alegação de vadiagem, desordem, embriaguez, somadas estas contravenções eram responsáveis por mais da metade das detenções.
Nas primeiras décadas da república, a capital federal se tornou palco de grande efervescência, a priori com a alta nos custos de vida, atrelado a diversos aspectos de desvalorização da moeda como catalizadores, a crise cafeeira, aumento no preço das importações que na época representava grande parcela dos produtos consumidos no Brasil, inclusive no Rio de Janeiro. Se a instalação da República não foi proclamada com mudanças profundas na estrutura brasileira, ela ao menos para o estado fluminense trouxe diversos benefícios e ônus por ser o palco das grandes decisões. Nas vantagens fica a relação de destaque entre os estados, sendo qualquer ato ocorrido ou citado no local ganhar forte repercussão. É notória segundo o autor, uma esperança de maior participação popular na política, não se restringindo apenas as elites, vários segmentos propunham maior abertura nas decisões nacionais, surgiu neste momento partidos e ideais políticos de origem européia, a exemplo dos jacobinos, grupo radical e nacionalista, queriam a expulsão dos estrangeiros e medidas mais que se estendessem as suas reivindicações, chegando a promover atentados contra o governo e alguns membros da alta cúpula política republicana, assim como fizeram no governo provisório. A dificuldade de inserção popular no novo sistema estava na fragmentação da população seja por etnia, religião ou oriundos de outras regiões do Brasil e exterior, fortaleciam a prática de abstenção das classes mais baixas da rotina política, resultando na repressão e extinção de partidos e movimentos revolucionários.

As intensas movimentações de ideias no fim do Império e início da República se caracterizou na valorização das práticas burguesas, aonde o liberalismo já havia sido implantado desde o regime imperial com a Lei de Terras em 1850. Apesar da propaganda realizada pelos vencedores da República, poucas transformações aconteceram nos direitos civis, a exemplo da maior participação do povo nas eleições , o que se viu foi uma redução substancial , mesmo se comparado com as eleições diretas, sabendo que um dos pré-requisitos exigidos seria não ser analfabeto, para a época impedimento suficiente para afastar as possibilidades de aumentar o eleitorado. As insatisfações com algumas propostas da República são evidenciadas com as solicitações por parte do exército, por ter sido excluído do regime após a sua instalação, os praças, considerados o "povo armado" estavam impossibilitados de gozar de um dos principais direitos republicanos, o voto.

Os anarquistas ou libertários cada vez mais se infiltravam na classe dos operários, as duas principais correstes estavam divididas entre os mais numerosos, anarquistas comunistas, que eram a favor da revolução social, abolição da propriedade privada e do Estado, admitindo o sindicalismo como arma de luta. Já a segunda corrente , os individualistas, também pregavam a abolição do Estado, porém não aceitavam organização não espontâneas, além de preferirem a conservação da propriedade privada.

No terceiro capítulo José Murilo de Carvalho relata as visões alguns autores sobre a participação do povo na República. Aristedes Lobo, diz que o povo fluminense ficou "bestializado" com o novo regime, outros autores compartilham críticas semelhantes, tecendo comparações entre a massa brasileira inativa e desinteressada, com as massas atuantes europeias. Os comentários segundo José Murilo são de caráter elitista e de certa forma racista, demonstrado através da incredulidade na participação dos brasileiros, pois estes são compostos por nativos e ex-escravos e só com a o incentivo de imigração de europeus o Brasil possuiria alma militante e consciente das funções cidadãs.

A maior preocupação do autor neste capítulo é detalhar como estava edificada a pirâmide social do Rio de Janeiro, com uma base larga de proletários afunilando-se ao passar pela classe operária, intermediária, até chegar ao pico estreito da classe alta composta de grandes banqueiros, capitalistas e proprietários. Depois faz analogia a capital da Argentina, Buenos Aires, com o Rio, é percebido que a primeira cidade ainda que possua o mesmo caráter comercial que a segunda, já havia conseguido absorver grande parte do proletariado e alargado a classe operária, diferente da realidade fluminense, onde essa classe menos abastada se encontrava à margem da organização social, passando despercebida entre os demais. Com o grande número de estrangeiros, sobretudo portugueses, o Rio de Janeiro tinha assumido um papel antinacional diante das províncias, sendo ela responsável pelos entraves e barreiras enfrentadas pelo regime vigente.

Ao narrar os acontecimentos da Revolta da Vacina José Murilo tenta mostrar a atuação não só do povo fluminense, mais de todas as classes abrangendo até mesmo a elite, seja por cunho moral, político ou cidadão, o autor ignora que a ação do povo neste acontecimento tenha sido apenas como massa de manobra, acreditando que sim, era possível a intervenção popular naquela invasão e exacerbação por parte do Estado em impor normas e leis nas quais estavam ultrapassando os limites democráticos da constituição.

Por isso acredito que o autor não concorda com a expressão de que o povo assistia aos acontecimentos no estado de uma forma "bestializados", mas sim bilontra, que seria o individuo astuto e com grande percepção dos fatores e ocorrências ao seu redor possibilitando as suas ações não de maneira convencional como queriam pensadores elitistas aos moldes europeus. É destacado pelo autor as manifestação populares, como festas e organizações de ordem religiosa, para ele existe uma forma brasileira e que o povo se manifesta e alcança os objetivos que anseiam.


CARVALHO, José Murilo. Os bestializados: o Rio Janeiro e a República que não foi. São Paulo: Companhia das Letras, 1987.

Um comentário:

  1. Acho que vc não entendeu o argumento do autor, ou não conseguiu expressar nessa resenha qual a tese que ele queria provar...
    Nota 6.0

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