terça-feira, 17 de abril de 2012

Resenha Critica - Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi

Por: Volnei Neto

 Na obra, Os bestializados, de José Murilo de Carvalho, o autor tenta remontar, diante de uma ótica própria e muita pesquisa, todo caldeirão de mudanças que ocorreram com o surgimento da república no Brasil. Ele nos convida a revisitar o Rio de Janeiro em seus primeiro passos como capital federal desta fase política e de como o povo inserido neste contexto reagiu a estas mudanças.
Como o próprio autor afirma em sua própria conclusão o livro transita em torno de três temas: o regime político, a cidade e a prática popular no que diz respeito a cidadania propriamente dita, ou seja, a forma como a população se comportava em relação as práticas políticas vigentes.
José Murilo acredita e fala em sua obra “que a republica, mesmo no Brasil, apresentou-se como regime da liberdade e da igualdade, como o regime do governo popular”. Ele também diz que a “cidade é o berço da civilização moderna” e que o Rio por ser a maior cidade apresentava todas as condições para “fornecer o caldo de culturas de liberdades civis, base necessária para o crescimento a participação popular”. Pg 161. O período de mudança de Império para a República ocorreu num momento em que o exercício da cidadania sofria sua primeira alteração de regime político após a Independência, o regime republicano tinha como objetivo aproximar mais o povo das atividades políticas, pelo menos assim desejavam os propagandistas mais radicais. Embora não tenha havido participação do povo na proclamação da republica, esperava-se que este despertasse na população excluída, à vontade de participar ativamente do novo regime.
Durante o transcorrer de sua obra observamos que o autor se embasa em uma profunda pesquisa, mais que a maioria dos fatos colocados traz consigo uma idéia de inércia do povo diante de toda reformulação política que ocorria neste momento histórico. Em sua visão a resultante dos embates ideológicos realizados na época, a ideologia das elites dominantes foi a que prevaleceu e esta passou de forma arrasadora nas formas alternativas de cidadania.
Verificamos que a obra faz uma abordagem bastante interessante sobre os cidadãos ativos e inativos, observamos duas vertentes importantes: Numa se encontra os ativos, cuja qual esta uma pequena parcela da sociedade e onde mesmo sendo grupos que se inseriam dentro pequena desta pequena parcela com direito a vota em sua maioria não exerciam este direito. Para se ter uma idéia 28% da população tinha direito a voto e apenas um pequeno percentual deste votava. Na outra vertente estavam à imensa maioria da população, que apesar de serem cidadãos livres não possuíam direito a voto.
De fato vemos bons argumentos de José Murilo refutando a apatia política na cidade do Rio de Janeiro, porém acredito que o mesmo tem uma tendência a analisar o povo brasileiro baseado num padrão europeu
Outro ponto que vale a pena constar neste texto é o fato de que boa parte dos cidadãos nesta época era estrangeira fazendo assim que as diversas etnias dificultassem a criação de uma ideologia própria.
Analisando a obra com um pouco mais de cuidado o próprio autor traz no último parágrafo do capítulo três, um trecho que fala da participação popular.
“em termos do sistema político formal, Couty e Raul Pompéia tinham razão: O Rio não tinha povo. O povo do Rio, quando participava politicamente, o fazia fora dos canais oficiais através de greves políticas, de arruaças, de quebra-quebras. Ou mesmo de movimentos de natureza quase revolucionaria como a revolta da vacina. Mais a maior parte do tempo dedicava suas energias participativas e sua capacidade de organização a outras atividades”
A citação acima, mesmo que de forma pejorativa, mostra indícios da participação indireta do povo e mostra também que existia uma discussão sobre política, onde a mesma algumas vezes chegavam até a vias de fato, fazendo assim transparecer a vontade popular.
Conforme citação do próprio autor, "a república que não era cidade, não tinha cidadão". "O povo não se enquadrava nos padrões europeus". Por isso, impossibilitada de ser "a República", a cidade mantinha suas repúblicas particulares, ou seja, seus núcleos de participação social, nos bairros nas associações, nas irmandades, nos grupos étnicos, nas igrejas, nas festas religiosas e profanas e mesmo nos cortiços e nas rodas de capoeira, que se transformaram, ao longo dos anos, em estruturas comunitárias que não se encaixavam no modelo contratual do liberalismo dominante na política. A despeito, foi a evolução destas repúblicas, algumas inicialmente discriminadas, que, se não perseguidas, que se formou a identidade coletiva da cidade.
Foi nelas que se aproximaram povo e classe média, foi nelas que se desenhou o rosto real da cidade, longe das preocupações com a imagem que se devia apresentar a Europa. Foi o futebol, o samba e o carnaval que deram ao Rio de Janeiro uma comunidade de sentimentos por cima e alem das grandes diferenças sociais que sobreviveram e ainda sobrevivem. Negros livres, ex-escravos, imigrantes, proletários e classe média encontraram nessa resistência o reconhecimento que lhes era negado pela sociedade e pela política, que os marginalizava, restringindo o seu forte apelo cultural. Apesar de terem se bestializado com a instalação do novo regime, que hipocritamente veio tolir seus direitos, eles deram a volta por cima.

Um comentário:

  1. Bom trabalho. Incompleto em alguns sentidos, porque faltou discutir, conforme seus próprios argumentos pediam,o conceito de bilontra...
    Nota: 8.0

    ResponderExcluir